Planos urbanísticos de São Paulo não foram adiante

No século passado, projetos engavetados levavam em conta o adensamento e a mobilidade urbana

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Por Carlos Eduardo Entini e Liz Batista
Atualização:
 

Durante o século 20, São Paulo sempre tentou se planejar a reboque dos seus problemas e, por que não, das suas mazelas. Assim fez o Plano de Avenidas de 1930, quando a cidade começava a conviver com o excesso de automóveis. A solução foi rasgar avenidas no centro e ao redor – as radiais – para escoar o trânsito. Do projeto desenvolvido pelo engenheiro Francisco Prestes Maia, veio a base estrutural da cidade, o centro expandido. Na década de 1950, a cidade vivia entre o orgulho e o caos, guiada pelo lema da “cidade que mais crescia no mundo”, e testemunhava o adensamento. Era a hora de pensar a descentralização.Em 1957, a Prefeitura, sob gestão de Wladimir Toledo Piza, contratou o padre dominicano francês Louis Joseph Lebret para racionalizar e planejar o crescimento da metrópole e preparar um Plano Diretor. Sob a coordenação de Lebret, a Sociedade para a Análise Gráfica e Mecanográfica Aplicada aos Complexos Sociais desenvolveu um trabalho pioneiro, o primeiro grande estudo sobre a capital paulista. Realizado segundo os métodos de análise de pesquisas sociológicas, demográficas, econômicas, urbanísticas, jurídicas e administrativa, o trabalho intitulado “Estudos das estruturas econômicas urbanas e humanas da aglomeração paulista” ficou pronto em 1958 e foi entregue ao novo prefeito, Adhemar de Barros. Na ocasião, Lebret afirmou que São Paulo revelava “o fenômeno mais gigantesco de crescimento urbano espontâneo que se pode observar em todo o mundo”.

 

Tendo a descentralização como palavra de ordem, os projetos propunham soluções para a proliferação de loteamentos e o desequilíbrio populacional entre os bairros, falta de estrutura básica em regiões periféricas, a saturação da zona central e a precariedade dos transportes públicos. Na época, as pesquisas revelaram, assim como hoje, que grande parte da população gastava de 2 a 4 horas no deslocamento de casa para o trabalho.Os projetos, porém, ficaram na gaveta. Mas, em 1968, os estudos de Lebret foram recuperados e usados como referência para a elaboração do Plano Diretor da gestão Faria Lima (1965-1969). A cidade mais humana pensada e planejada por Lebret era agora inspiração e meta para o Plano Urbanístico Básico. São Paulo vivia uma explosão populacional. Em pouco mais de duas décadas, a população quadruplicou: em 1940, eram 1,3 milhão de habitantes; em 1969, quase 6 milhões. O fenômeno só tornara a cidade mais caótica. Em agosto de 1968, o engenheiro Mario Laranjeira de Mendonça, que trabalhou com o padre Lebret, começava a montar o projeto do Plano Urbanístico Básico de São Paulo. O PUB reuniu uma equipe de técnicos brasileiros e estrangeiros, sob a promessa de uma “cidade mais humana em 1990”.

 

No caderno especial dedicado ao lançamento do plano, publicado pelo Estado em 29 de março de 1969, o prefeito defendeu em carta que o futuro da cidade deveria ser ordenado e planejado junto com o desenvolvimento, que “não pode ser freado”. No transporte público, a rede de metrô deveria ser de mais de 600 km, e a malha de vias expressas deveria cobrir uma extensão ainda maior. Na entrega do projeto ao prefeito Faria Lima, em fevereiro de 1969, o Plano Urbanístico Básico já tratava da construção do metrô, a “solução viária indispensável para São Paulo”.São Paulo do Futuro. O metrô já havia sido proposto como saída para melhorar a circulação no final da década de 1920. Na época, a São Paulo Tramway, Light and Power, concessionária dos serviços públicos de transportes e energia, administrava 250 km de linhas de bondes e propôs a instalação das “linhas de trânsito rápido. O projeto, chamado “São Paulo do Futuro”, apresentado em 1927, justificava a criação do “subterrâneo”, não pela “intensidade do tráfego”, explicava a empresa, mas “pela insuficiência das ruas”. Só em 1972 o metrô iniciou suas atividades em São Paulo.

 

Para a arquiteta Nadia Somekh, autora do livro A Cidade que não Pode Parar, resultado de pesquisa feita por professores do Mackenzie e coordenada por ela, onde foram analisados os planos urbanísticos de São Paulo no século 20, os projetos, de um modo geral, foram implementados. “Nem tudo foi engavetado, foram feitas adaptações moldando as propostas técnicas”, diz. Ainda para Nadia,"os planos têm algo em comum: eles contam a “história da preparação da cidade para o automóvel” e a “desistência recorrente do transporte coletivo”.# Siga: twitter@estadaoacervo | facebook/arquivoestadao | Instagram | # Assine

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