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Mármores do Museu do Café em Santos revelam fósseis de 60 milhões de anos

Visitantes estão 'pisando em mares que não mais existem', diz geógrafa que mapeia fósseis nos pisos e paredes do museu

Por Carlos Eduardo Entini
Atualização:
Fósseis marinhos visíveis nos mármores do Museu do Café em Santos. Foto: Fernanda Luz/Estadão

Ao entrar no edifício do Museu do Café, em Santos, o visitante  automaticamente tem seu olhar atraído para a arquitetura de inspiração renascentista italiana, para o mobiliário da época onde aconteciam os pregões na Bolsa Official do Café e ao vitral do teto e quadros de  Benedito Calixto. Mas agora o olhar deverá ser dirigido também para o chão e para as paredes, pois ao passear pelo edifício os visitantes estão pisando no fundo de um mar que não existe mais, formado milhões de anos atrás.

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A razão é que o museu também tem um acervo desconhecido do grande público nas suas paredes e nos pisos. Tratam-se de vários fósseis marinhos presentes nos mármores que adornam o prédio que originalmente abrigou a Bolsa Official de Café, que completa um século em 2022. “As pessoas estão pisando em materiais que se formaram em mares do passado, mares que não mais existem”, explica Angela Frigerio, geóloga e geógrafa que, entre outras atividades, desenvolve o trabalho de catalogação da geodiversidade no centro histórico de Santos.

A matéria-prima usada para adornar o prédio é proveniente de vários lugares. Do granito extraído no estado de São Paulo a materiais vindos da Europa, como os mármores dos tipos carrara branco, azul turco, negro francês, negro cihigue, montoussé, vermelho do Languedoc, rosso Verona e o lioz português, que servia de lastro para os barcos portugueses que chegavam em Santos. É nos dois últimos que os fósseis podem ser melhor percebidos. Os outros também possuem fósseis, mas estão prensados.

[Veja a galeria em outra janela]

A datação dos fósseis de origem marinha, no caso do lioz português, remontam ao período Jurássico e o Cretáceo, ou seja, entre 200 e 66 milhões de anos atrás, explica Frigiero. É nesse material que estão registrados os extintos moluscos rudistas. Ainda segundo a geóloga, os fósseis encontrados no lioz português “representam  organismos do antigo mar de Tethys, o precursor do mar Mediterrâneo".

"É como mergulhar no fundo do mar, é um pedaço da história de Santos mas ao mesmo tempo nos remete a 60 milhões de anos", ressalta a professora de geologia e palenteologia  (veja na galeria os detalhes dos fósseis encontrados).

Com seu olhar milimétrico e sua régua, Angela Frigerio já encontrou outros fósseis além dos que estão no Museu do Café. Como funcionária da Secretaria de Desenvolvimento Urbano (Sedurb) da cidade de Santos, seu objetivo é desenvolver um mapa da geodiversidade no centro histórico da cidade portuária. Ela já encontrou registros nos mármores da Igreja do Valongo, na sede da prefeitura e no prédio do Banco do Brasil.

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A geóloga Angela Frigerio fotografando fósseisna prefeitura de Santos e no Museu do Café. Foto: Fernanda Luz/Estadão

Os fósseis de animais extintos, que duraram milhões de anos gravados nas pedras, podem correr risco caso não tenham manutenção correta, alerta a geóloga. Os mármores, assim como o lioz, são materiais cuja composição química (carbonato de cálcio) é sensível a produtos com cloro. Assim, devem ser limpos com substâncias adequadas para evitar a dissolução do carbonato de cálcio. "O pisoteio também provoca desgastes e poderia ser discutida alguma estratégia para este problema”.

Geodiversidade.  A geodiversidade é um ramo do conhecimento que busca mostrar a variedade dos processos e materiais geofórmicos que nos cercam e formam a paisagem. A observação de formações rochosas é mais comum ao ar livre, mas também está no meio urbano. “As cidades, com suas vias, praças, edificações e equipamentos foram e continuam sendo consumidoras de recursos geológicos, dando origem a locais que permitem sua visualização para divulgação das geociências de forma a colaborar para que sejam restabelecidos elos cognitivos entre a dinâmica do planeta e da vida no planeta com a dinâmica de uma comunidade”, explica Frigiero.

Portanto, continua a geógrafa, “a construção desse acervo não se destina exclusivamente ao serviço de técnicos, mas é voltado também para a população em geral, aos estudantes, professores e todos os que quiserem conhecer um patrimônio que guarda a história da Terra e a história da vida no planeta”.

Vista do piso de mármore do Museu do Café em Santos. Foto: Fernanda Luz/Estadão

 Site do Museu do Café Rua XV de Novembro, Santos - SP

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