Duvido que alguém deixe de comprar taro por não saber a diferença entre cará e inhame. Mas, se a confusão semântica não atrapalha as vendas, o fato é que desde que Pero Vaz de Caminha confundiu mandioca com cará, a que chamou de inhame, produtores, feirantes, cozinheiros, cientistas e tradutores se batem para decifrar quem é quem.
É que o cará, raiz bojuda, marrom, de polpa branca e granulada, do gênero Dioscorea, é chamado de inhame no Norte e Nordeste do Brasil. No restante do País, inhame é o nome do vegetal conhecido internacionalmente como taro, a Colocasia esculenta, planta da família das aráceas, originária da Índia e da Malásia.
FOTO: Felipe Rau/Estadão
Sei que não é fácil mudar o nome popular de um item alimentício, mas em nome do bom entendimento, podemos tentar adotar o taro. E o outro fica sendo cará mesmo ou inhame.
O taro é a base da alimentação tradicional dos havaianos, que utilizam não só os rizomas, mas também os talos e as folhas. Sempre cozidos – afinal, aprendeu-se que o calor reduz seu efeito irritante (leia abaixo), especialmente se a água do cozimento for descartada. Havaianos comem taro na forma de poi, uma pasta feita com o legume cozido e socado em tachos de madeira com mão de pilão feita de pedra esculpida em forma de sino compacto.
RECEITAS: - Como cozinhar inhame - Bolo de inhame - Bolinho frito de taro - Polenta com taro e cebola dourada Essa pasta pode ser comida fresca, sem sal nem açúcar, ou fermentada. Acompanha carnes e peixes ou é comida pura, como um mingau. Com um processador de alimentos você pode fazer seu poi e comer no café da manhã. É revigorante, gostoso, suave. Para fermentar, é só colocar o purê numa tigela, cobrir com pano e deixar em temperatura ambiente até criar bolhas. Mas eu prefiro o fresco, com mel ou melado.
Já no mundo asiático os pratos com taro são muitos: doces, sopas, refogados, cestas crocantes para saladas, bolinhos fritos e assados, brancos, roxos naturais ou coloridos de azul com flores de ervilha-borboleta. E vários deles servem de inspiração para ousar mais no uso do legume tão bem adaptado entre nós, que usamos mais à sombra das batatas.
Aliás, o taro dura dias em temperatura ambiente, em local fresco. E quando apodrece, vai se encolhendo com dignidade, nunca com aquele exagero da podridão das batatas. Esquecido por algum tempo, quase sempre nos brinda com um broto – é só enfiar na terra e regar para receber novos taros.
Para instigar você a correr comprar taro, deixo três receitas: o bolo de fubá do Vale do Paraíba é quase uma broa rústica, feito com um ovo, pouco açúcar, sem farinha de trigo e sem manteiga, com o taro e sua baba no lugar de mais ovos; uma polenta com pedaços de taro e cebola roxa dourada que serve de entrada, prato único ou aperitivo, frio ou reaquecido no forno com uns pedaços de queijo por cima; e um bolinho frito, o taro dispensando a liga dos ovos, sem leite, sem trigo, o vegetal se bastando. E, tudo bem, vá lá, você pode assar se tiver medo de óleo, mas uma friturinha crocante a cada renúncia de papa não mata.
Taro. Havaianos comem não só as raízes, mas talos e folhas, cozidos.
Aprenda a manusear para ele não pinicar
Já vi gente tomando suco de taro cru para purificar o sangue e desintoxicar o corpo, seja lá o que essas coisas queiram dizer. E há quem recomende ainda dar inhame cru a crianças e interromper se acaso pinicar. É que o taro e outros membros comestíveis da família das aráceas, como a taioba e o mangarito, têm oxalatos de cálcio que podem vir em variadas concentrações e o efeito imediato é como morder uma almofadinha de agulhas.
Algumas pessoas parecem ser mais sensíveis que outras e podem começar a sentir irritação e coceira já nas mãos ao manusear o taro. Cortá-lo embaixo de água ou usar luvas são algumas soluções. Mas, além do oxalato, o taro contém outras substâncias irritantes e a combinação delas pode causar edema na boca, coceira e vômito, evoluindo para mais complicações às vezes.